A identidade da Arquitetura Portuguesa
Uma jornada pela arquitetura moderna de Portugal guiada por grandes arquitetos e forte identidade.
Ao discutirmos a modernidade na arquitetura, muitas vezes negligenciamos o elemento da identidade, essencial para a expressão de uma nação e de um lugar, algo que parece ausente na maior parte da arquitetura contemporânea europeia. Portugal, no entanto, destaca-se como uma realidade distinta, evidenciada por notáveis contribuições para o design arquitetônico moderno e contemporâneo.
Os irmãos Manuel e Francisco Aires Mateus, fundadores da Aires Mateus Associados, têm se destacado por suas contribuições significativas para a arquitetura contemporânea, com projetos de grande escala e relevância internacional. Portugal é simbolicamente vinculado à exploração e à busca pela modernidade, adotando uma abordagem consciente na arquitetura que reflete sobre sua própria identidade em comparação aos princípios modernos. Isso resulta em uma metodologia extraordinária que atravessa desde a era das descobertas até a contemporaneidade, reafirmando tradições e permanecendo profundamente enraizado na terra.
Após liderar mundialmente, Portugal tornou-se uma nação pequena, com um papel marginal na Europa durante grande parte do século XX. Esse isolamento preservou a nação de diversas tendências europeias, mantendo um enraizamento profundo à terra e uma obsessão pela própria identidade, permitindo o desenvolvimento de um projeto contemporâneo exemplar.
No cenário arquitetônico, nomes como Siza, Távora e Souto de Moura destacam-se, transformando suas obras em jornadas sensoriais, minimalistas e modernas. A presença de 21 propostas portuguesas no prestigiado Prêmio Mies van der Rohe, com Álvaro Siza como pioneiro em 1988, convida-nos a explorar Portugal através das obras desses arquitetos, apreciando ainda mais seu valor artístico.
A história da arquitetura portuguesa evoluiu significativamente com o Inquérito à Arquitectura Regional entre 1955 e 1961, contribuindo para uma identidade própria. Hoje, nomes como Álvaro Siza, Eduardo Souto de Moura e Fernando Távora, junto com outros, são referências não apenas no cenário luso, mas também internacional. A arquitetura portuguesa, enraizada em sua história, continua a desafiar horizontes, preservando sua identidade diante das transformações sociais e econômicas.
Álvaro Siza
O primeiro a receber o Prêmio Mies van der Rohe em 1988, o Prêmio Pritzker em 1992 e o Prêmio Nacional de Arquitetura de Espanha em 2019, transcende fronteiras com seu estilo singular. Ele incorpora a arquitetura modernista nas regiões para as quais projeta suas obras, estabelecendo uma conexão com técnicas de construção tradicionais, enquanto capta a sensibilidade de cada localidade.
A arquitetura de Álvaro Siza é um testemunho da fusão entre a tradição e inovação, onde cada projeto é uma ode à simplicidade e à harmonia. Assim como outros autores premiados, como Eduardo Souto de Moura e Carrilho da Graça, Siza tem contribuído significativamente para a arquitetura portuguesa. Siza cria espaços que refletem as necessidades humanas e se integram ao ambiente circundante. Seus edifícios são caracterizados por formas geométricas puras e materiais naturais, obras que emanam uma sensação de serenidade e equilíbrio. Além disso, Siza é conhecido por sua capacidade de criar espaços públicos dinâmicos e inclusivos, que se tornam pontos de encontro e interação social.
Entre suas notáveis contribuições à paisagem portuguesa, destacam-se o Pavilhão de Portugal na Expo de Lisboa de 1998, a Fundação Serralves e projetos habitacionais no Porto, a Biblioteca Municipal de Viana do Castelo, a Igreja de Santa Maria em Marco de Canaveses, a adega Adega Mayor em Elvas, as Piscinas de Leça da Palmeira e a Casa de Chá Boa Nova, situada nos penhascos à beira-mar em Matosinhos, sua cidade natal.
Conheça a biografia de Alvaro Siza
Eduardo Souto de Moura
Laureado com o Prêmio Pritzker em 2011, tem o seu nome ligado aos de Siza e, claro, Fernando Távora, a tríade arquitetônica mais conhecida de Portugal. Ele declara sua “obsessão pela transformação do patrimônio, transitando de uma perspectiva contemplativa e monumental para um espaço funcional“.
A arquitetura de Eduardo Souto de Moura é uma expressão magistral de simplicidade e sofisticação, onde forma e função se unem de forma minimalista e atemporal. Com sensibilidade aguçada para a topografia e o contexto histórico, Souto de Moura transforma cada projeto em uma narrativa arquitetônica onde a simplicidade das linhas e a precisão da execução criam uma experiência espacial extraordinária. A escolha cuidadosa de cada material é fundamental para a criação de espaços que dialogam com o entorno e a história do local.
Seus notáveis projetos incluem o Estádio Municipal de Braga, o Museu Nacional dos Transportes no Porto, o sistema de metrô da cidade, a Escola de Hotelaria e Turismo de Portalegre, o Convento Santa Maria Do Bouro, o Espaço Miguel Torga em Sabrosa, a piscina infinita da Quinta do Crasto em Pinhão e o Convento das Bernardas em Tavira.
Fernando Távora
O terceiro nome de destaque, fundador da Escola Arquitetônica do Porto, Fernando Távora é reconhecido por sua sensibilidade às características locais e sua ênfase na integração com o entorno, respeitando a história e a cultura de cada lugar. Sua arquitetura que incorpora elementos tradicionais e contemporâneos, tecendo uma narrativa entre o passado e o presente.
Suas obras destacam-se pela simplicidade formal e pela atenção aos detalhes, resultando em edifícios que se harmonizam organicamente com o ambiente construído e natural. Um exemplo notável é a Faculdade de Arquitectura de Tournai, na Bélgica, onde a arquitetura se transforma em uma aula permanente para os estudantes. Além disso, Távora era um fervoroso defensor da participação comunitária no processo de projeto, buscando sempre criar espaços que atendam às necessidades e aspirações das pessoas que os utilizam.
Távora deixou sua marca no Mercado Municipal de Santa Maria da Feira e no parque municipal da Quinta da Conceição em Matosinhos. Também contribuiu significativamente para a Escola Primária do Cedro em Vila Nova de Gaia, o planejamento da Zona Central de Aveiro, a Casa do Cinema Manoel Oliveira no Porto, a restauração da Rua Nova de Guimarães e a construção do novo edifício da Assembleia da República de Portugal, em colaboração com Siza.
Aires Mateus
A arquitetura dos irmãos Manuel e Francisco Aires Mateus é reconhecida por sua elegância minimalista e pela exploração cuidadosa de formas geométricas simples. Com uma abordagem contemporânea e sofisticada, suas obras refletem uma profunda reflexão sobre o espaço, a luz e a materialidade. Manuel Aires Mateus, um dos fundadores, é conhecido por sua abordagem única e inovadora na arquitetura.
Cada projeto dos Aires Mateus é concebido como uma resposta única ao contexto específico em que se insere, resultando em edifícios que se integram harmoniosamente ao ambiente e à paisagem ao seu redor. Suas criações são marcadas pela pureza formal e forte conexão com a tradição arquitetônica portuguesa, (re)interpretada de maneira contemporânea e inovadora. Entre seus projetos notáveis está a sede da EDP em Lisboa, que se destaca pela construção inovadora e pela praça virada a sul protegida por brise-soleils.
Como projetos de destaque, o Convento da Trindade em Coimbra, o Centro de Convívio de Grândola, o Centro de Interpretação da Lagoa das Furnas em São Miguel, Açores, a Casa Monsaraz e as Cabanas em Comporta.
João Mendes Ribeiro
Natural de Coimbra, foi professor assistente de Fernando Távora na Faculdade de Arquitetura da Universidade do Porto. Seu estilo também aposta em geometrias retas e uma paleta de cores neutras, tornando o branco o elemento principal sem abrir mão de materiais como cimento, e busca a luz natural.
Além de sua prática arquitetônica, Ribeiro leciona na Universidade Lusíada e na Universidade Independente de Lisboa, contribuindo para a formação de novos arquitetos.
A arquitetura de João Mendes Ribeiro é uma expressão da harmonia entre tradição e modernidade, onde passado e presente se encontram de forma sofisticada. Reconhecido por sua abordagem sensível, Ribeiro incorpora elementos históricos e culturais em seus projetos contemporâneos, com atenção meticulosa aos detalhes. Ao mesmo tempo, ele não hesita em introduzir elementos inovadores e surpreendentes, criando uma síntese cativante entre o antigo e o novo.
Seu estilo é evidente em obras como o Centro de Artes Contemporâneas Arquipélago em Ribeira Grande, a Adega Torre de Palma em Monforte, o Claustro do Mosteiro de Lorvão em Penacova, e em residências como a Casa da Escrita em Coimbra, Fonte Boa House e Casa em Chamusca da Beira.
Identidade portuguesa
Diante dessa diversidade e riqueza do cenário arquitetônico contemporâneo em Portugal, destacam-se como pontos chave da identidade portuguesa o compromisso com a tradição, a inovação e a sensibilidade ao contexto local.
A força da forma e função ao caminharem juntas, respondendo a todos os "por quês" de cada projeto.
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